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quarta-feira, 23 de abril de 2025

Guiné 61/74 - P26716: Facebook...ando (74): Manuel Ribeiro de Faria, ex-cap inf, cmdt da CCAÇ 3414 (Sare Bacar, Cumeré, Brá, 1971/73), a subunidade a que pertenceu o nosso saudoso amigo e camarada Joaquim Peixoto (1947-2018)




Joaquim Peixoto (1949-2018), ex-fur mil arm pes inf, 
CCAÇ 3414 (Sare Bacar, 1971/73)


1. Há muito que não falamos aqui do Joaquim Peixoto (Penafiel, 1949-Porto, 2018): 

(i) foi ur mil arm pes inf, MA, CCAÇ 3414 (Sare Bacar e Bafatá, 1971/73); 

(ii) professor do 1º ciclo,  reformado, vivia em Penafiel, e era casado com a Margarida Peixoto, também ela professora do ensino básico, reformada;

(iii) e ambos membros da nossa Tabanca Grande, para além de amigos da Quinta de Candoz;


Joaquim e Margarida.
Monte Real, 2010.
Foto de Manuel Carmelita
(iv) a morte, sempre traiçoeira, levou-o sem poder completar os 70 anos;

(v) era uma figura muito querida na sua terra, e ,muito querida também de todos nós (e em especial. da Tabanca de Matosinhos e de "O Bando do Café Progresso");

(vi) o casal participou ainda por diversas vezes dos Encontros Nacionais da Tabanca Grande, em Ortigosa e  Monte Real;

(vii) o Peixoto integrou a Tabanca Grande em 11/7/2009;  

(viii) tem cerca de meia centena de referências no nosso blogue. A CCAÇ 3414, por sua vez, tem 22 referências.

Infelizmente mais nenhum "falcão de Sare Bacar" apareceu aqui com a vontade expressa de preencher o lugar vazio deixado pelo  Joaquim Peixoto que "da lei da morte já se libertou". 

É verdade que o grosso da companhia era malta dos Açores (que só se reencontrou pela primeira vez em 2012, na Ilha Terceira). 

A CCAÇ 3414 foi mobilizada pelo BII 17, Angra do Heroísmo. E foi comandada pelo cap inf Manuel José Marques Ribeiro de Faria, hoje cor inf ref.


2. Há quinze dias passámos na A4, em Penafiel, a caminho de Candoz,  e lembrámo-nos dos nossos amigos Joaquim e Margarida Peixoto. 

Por outro lado, há dias deparei-me com a página do Facebook do cor inf ref Manuel Ribeiro de Faria que, de resto, é amigo do Facebook da Tabanca Grande (temos 22 amigos em comum). 

Com a devida vénia, recuperei algumas das fotos do seu álbum, com destaque para a sua passagem pelo CTIG (onde foi alferes ou tenente em Có, em 1968/69, e depois capitão, em 1971/73, em Sare Bacar).  Tem um brilhante currículo militar, tendo servido o Exército Português até 2008.

Gostaria que ele se juntasse ao blogue da Tabanca Grande. Tenho o nº 902, sob o nosso  fraterno poilão, no caso de ele aceitar o meu convite para se juntar ao blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné.

Recordo aqui um dos seus postes, com data de 24 de dezembro de 2019, 06:55


Natal !... Este é o meu septuagésimo sexto!...

Temos de concordar que já vou tendo alguma experiência...

Vi e vivi muitos tipos de Natal, Natais europeus, Natais africanos, até asiáticos [em Goa, na Índia (1947/48/49)], uns em clima de paz, outros até de guerra, os primeiros em que se esperava a prenda (raramente "as prendas") posta no sapatinho pelo Menino Jesus que viria a ser substituído por um Pai Natal. Alguém deve ter pensado que era exploração infantil... E mais, não é que já há também uma Mãe Natal? (Elas estão a tomar conta disto)...

De todos os Natais que vivi, tiveram especial significado aqueles passados no calor da Guiné, em 1971 e 72, em noites de vigília (de prevenção, esperando um possível ataque, já que o PAIGC tinha essas tentações), visitando vários núcleos de defesa (postos de combate) onde os meus soldados, os meus "Falcões" açorianos, com pequenas celebrações lembravam a data, as famílias distantes, mas onde tinham uma pequena lembrança para o seu Capitão (ainda guardo algumas delas), pequenas e singelas no tamanho, enormes, descomunais, no significado.

Nesta época passam-me pela memória todos os meus Amigos (isto, segundo as regras que eu aprendi, inclui as Amigas) e desejo-lhes o melhor deste mundo contido na tradicional mensagem "Feliz Natal e um Bom Ano Novo"...
Peço-lhes, em troca, um momento de reflexão para todos aqueles a quem a Noite de Natal não é tão abençoada como aquela que mereciam, sobretudo as crianças que, por esse Mundo fora, não têm Ceia de Natal e não sabem sequer, muitas delas, se terão algo para se alimentarem no dia seguinte.

Assim, como militar que sou e serei sempre, envergo o meu melhor uniforme para, em sinal de respeito, desejar a todos os meus Amigos um Feliz Natal.



Cor inf ref Manuel Faria Ribeiro (n. 1943) 



Angola > 1959 > O jovem Ribeiro de Faria, Comandante de Bandeira
 na Milícia da Mocidade Portuguesa  



Academia Militar > 1965 (lapso, deve ser 1963) > 
Aluno-cadete, 1º ano, ao lado de sua mãe




Guiné > Zona leste >  Região de Bafatá > Sector L1  > Susetor de Sare Bacar >
 Sare Bacar> 1973 > Cap inf, cmdt da CCAÇ 3414 (1971/73)



Angola > Março de 1996 a Setembro de 1997, ao serviço como Chefe do Estado Maior da UNAVEM III (United Nations Angola Verification Mission), depois MONUA (Mission d'Observation des Nations Unies Angola).



Guiné > Zona Oeste > Có >  1968 > "Aquartelamento de Có, ainda muito "piriquito"(era assim que eram chamados os inexperientes recém-chegados), ainda cheio de ideias. Procedimento que sempre adoptei, quando saía para uma operação, levava perto a mim um apontador de metralhadora MG-42, um apontador de Morteiro 60 mm, um apontador de Lança Granadas-Foguete e um Radio-telegrafista.

"Eu (o comandante), levar as fitas de carregamento da metralhadora, armado em Pancho Villa, era uma fantasia que a experiência cedo corrigiu... Eu estava lá para comandar, avaliar a situação, dar as ordens e coordenar a acções ou reacções adequadas, e não para terefas que não eram nem deviam ser da minha competência.

"Os ensinamentos que colhi, muito me serviram e ajudaram na posterior preparação da minha Companhia de Caçadores Independente 3414 com que voltei à Guiné". (Julgamos que em Có o  Manuel Ribeiro de Faria devia alferes ou tenente.)
 


Guiné > Zona Leste > Região de Bafatá > CIM Contuboel > "Nasceu em 11 de Abril de 1910, em Estremoz, António de Spínola. Recordo esta figura notável não de honrarias palacianas, mas das operações nas bolanhas da Guiné, onde pude, de muito perto e com muita honra, servir sob as suas ordens. Captei esta imagem em 1972 quando, em Contuboel, Spínola presidia à cerimónia de encerramento de um Curso de Formação de Milícias que eu dirigia."

Fotos (e legendas): : © Manuel Ribeiro de Faria (2025). Todos os direitos reservados [Edição: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


3. O
 cor inf ref Manuel Ribeiro de Faria, filho e neto de militares, nasceu em 1943,  viveu em Goa,  em Moçambique e em Angola. O pai, Manuel Ribeiro  de Faria (por sua vez nascido em 1915,  Inhambane, Moçambique) morreu com o posto de tenente-general, segundo apurámos da sua página do Facebook.

Em 1954 vivia em Angola, começando a frequentar o Colégio Alexandre Herculano - Nova Lisboa, hoje Huambo, e voltaria a Angola em 1996 como Chefe do Estado Maior da UNAVEM III. 

Fez duas comissões de serviço no CTIG.  Deve ser do curso de 1963 na Academia Militar. Segundo a sua página no Facebook, nasceu em Mafra e mora em Oeiras. A sua última função no Exército foi a de diretor do Museu Militar. Interessa-me particularmente pela história militar.
 

4. Ficha de unidade > Companhia de Caçadores n.º 3414

Identificação: CCaç 3414

Unidade Mob: BII 17 - Angra do Heroísmo

Crndt: Cap Inf Manuel José Marques Ribeiro de Faria

Divisa: "Antes Morrer Livres Que em Paz Sujeitos"

Partida: Embarque em 23Jun71; desembarque em 02Jul71 | Regresso: Embarque em 23Set73

Síntese da Actividade Operacional

Após realização da IAO, de 5 a 31ju171, no CIM, em Bolama, seguiu em 5ag071 para Sare Bacar, a fim de efectuar o treino operacional e a sobreposição com a CCaç 2636. 

Em 27Ag071, assumiu a responsabilidade do subsector de Sare Bacar, com pelotões destacados em Sora e Sare Aliú Sene, ficando integrada no dispositivo e manobra do BArt 2920 e depois do BCaç 3884.

Em 18mai73, foi rendida no subsector de Sare Bacar pela CCaç 4147/72 e seguiu, em 20,ai73, para Cumeré, tendo reforçado o dispositivo do COP 8, de 4jun73 a 5jul73.

Em 5jul73, substituindo a CCaç 3518, assumiu a responsabilidade do subsector de Brá, ficando na dependência do COMBIS, com vista a garantir a segurança e protecção das instalações e das populações da área. No período efectuou ainda escoltas a colunas de reabastecimento a Farim, Binta, Guidage e Mansabá.

Em 25set73, foi substituída no subsector de Brá pela CCaç 3477, a fim de
efectuar o embarque de regresso.

Observações - Tem História da Unidade (Caixa n." 96 - 2ª Div/4ª  Sec, do AHM).

Fonte: Excerto de Portugal. Estado-Maior do Exército. Comissão para o Estudo das Campanhas de África, 1961-1974 [CECA] - Resenha Histórico-Militar das Campanhas de África (1961-1974). 7.º volume: Fichas das Unidades. Tomo II: Guiné. Lisboa: 2002, pág. 405.

(Seleção, revisão / fixação de texto: LG)
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quarta-feira, 20 de novembro de 2019

Guiné 61/74 - P20367: (Ex)citações (262): Acção Mabecos, 22/2/1971: 5 obuses 14.0 cm, 4 peças 11.4 cm, 380 granadas de artilharia pesada (Pel Art Piche, Canquelifá e Sare Bacar) contra Foulamory, 3 meses depois da Op Mar Verde... Mas tudo correu mal... nessa fatídica segunda-feira de Carnaval (Domingos Robalo / Cherno Baldé / Helder Sousa)


Guiné > Região de Gabu > Carta de Piche (1957) > 1/50 mil > Detalhes > Percurso Piche > Amedalai > Sagoia > R Sagoia > R Cimongru > R Nhamprubana. A sudeste dwe Piche ficava a base do PAIGC, Foulamory,na região de Boké, ao alcance, a partir da fronteira, da artilharia portuguesa (peça 11.4 e obus 14).

Infografia: Blogue Luís Graça &  Camaradas da Guiné (2019)


1. Pedi ontem, ao Domingos Robalo, para esclarecer uma dúvida do amigo e colaborador permanente, Cherno Baldé, que vive em Bissau, dúvida essa que ele deixou em comentário ao poste P20364 (*)

Caro amigo Domingos Robalo,

Tenho dificuldades em compreender que uma operação que se passa na secção de Piche, na região de Gabu, a leste, tenha solicitado apoio de artilharia de Saré Bacar, situada no Norte, na região de Bafatá, a nordeste de Contuboel, tendo outros aquartelamentos relativamente mais perto e também com artilharia, casos de Canquelifá, Pirada, e penso que Paunca também. 

Faço esta questão, todavia, sem saber exactamente, qual foi o trajecto seguido durante a tal operação. Pareceu-me estranha esta informação, a não ser que haja outra tabanca com o mesmo nome.

Abraços,

Cherno Baldé

19 de novembro de 2019 às 17:49


2. Resposta do Domingos Robalo (*)

Caro Cherno Baldé, viva.

Com as minhas saudações dirigidas a si, saúdo, também, esse belo povo Guineense com quem tive oportunidade de conviver, uma vez que os homens que tive a honra de comandar eram do recrutamento do Território.

Vinte e quatro meses de comissão, sempre rodeado de militares Guineenses,  foram para mim uma aprendizagem de vida que nunca esquecerei. Através do Luís Graça, colocou uma questão, que, cinquenta anos volvidos, não têm resposta imediata, pelo que tive necessidade de confirmar o que passo a comentar.

A operação [ou Acção] Mabecos, executada a partir de Piche, tinha como objecto a retaliação com fogo de artilharia [, à base IN de Foulamory, na região fronteiriça]. Os obuses adequados e definidos para a operação eram os de 14 cm [, Saré Bacar e Canquelifá, não me recordando se havia peças de 11,4 cm, com maior alcance. [, Sim, havia as de PIche.]

Então, convocaram-se os Pelotões de Artilharia de Saré Bacar, com 3 obuses 14,0; Canquelifá com 2 obuses [,14,0] e o pelotão reforçado de Piche, com 4 obuses [, peças 11.4][. Bajocunda e Pirada tinham obuses 10,5 cm, não sendo adequados à Operação.

Embora Sare Bacar fosse "longe" de Piche, estas foram as decisões, de ordem operacional e logística, que o Comando Operacional Territorial tomou. Por curiosidade, posso referir que o alferes, comandante do Pelotão de Sare Bacar, participante na operação,  era sobrinho directo do então Ministro do Exército [ , Horácio José de Sá Viana Rebelo, 1910-1995], tendo tido eu um outro camarada de artilharia, colocado em Catió, que era filho de um dos deputados à Assembleia Nacional, cujo pai veio a falecer com a queda de um héli junto a Mansoa, na sequência da visita que um grupo de deputados fazia a território Guineense.

Aproveitando esta comunicação: em Maio de 2017 estive num encontro de confraternização com combatentes na Guiné, em que tive a honra de partilhar ideias com o Sr. Embaixador da Guiné-Bissau, em Lisboa, o Sr. Hélder Jorge Vaz Gomes Lopes, que simpaticamente aceitou o convite que lhe tinha sido endereçado.

Uma outra nota de registo, no tempo em que estive na Guiné (1969/1971),  os militares que visitavam as mesquitas, deixavam à porta as botas e as espingardas G3, em sinal de respeito, não só pelos crentes como pela religião que estes professavam. Claro, que nem sempre terá sido assim.

Esperando ter ido ao encontro da sua expectativa atrevo-me a perguntar-lhe se está vivendo na Guiné.

Com um abraço de amizade, fico ao dispor

Domingos Robalo

(combatente e defensor do povo Guineense)

3. Comentários adicional do editor LG:

A Acção Mabecos, em 22/2/1971, destinou-se a escoltar e montar segurança a forças de artilharia, vindas de Piche (4 peças 11,4), Sare Bacar (3 obuses 14) e Canquelifá (2 obuses 14), e que iam fazer barragem de artilharia junto à fronteira, nas proximidades do Rio Nhamprubana, afluente do Rio Coli que divide os dois territórios... O objetivo era atacar ou flagelar a base do PAIGC, em Foulamory, na região de Boké, a sudeste de Piche.

O Pel Art de Sare Bacar, com 3 obuses 14 (longo alcance) vieram de propósito para esta ação, desde a fronteira com o Senegal, via Contuboel, Bafatá, Nova Lamego... Como o Hélder Sousa, que estava lá em Piche nesta altura, houve uma série de contratempos, que inviabilizaram a Acção... E não foi apenas a emboscada, retomaremos o assunto num próximo poste.

De acordo com a carta de Piche (1957), não havia nenhuma povoação com o nome "Sare Bacar"... Os de Sare Bacar, e os de Canquelifá, os Pel Art (Pelotões de Artilharia) é que vieram dar uma ajudinha ao subsetor de Piche... Há assim, à saída de Piche uma tabanca chamada Amedalai, topónimo vulgar na Guiné.

Veja-se o extenso esclarecimento prestado pelo Hélder Sousa (*).

Sobre a Acção Mabecos, sabemos qual era a Ordem de operações (nº 1, 21 de fevereiro de 1971):

Composição das forças;

(i)  CART 3332, a 4 pelotões;

(ii)  3º e 4º Pel / CCAV 2749 ( BCAV 2922);

(iii) 2 Secções de milícias da CM 249;

(iv) 1 Secção de milícias da CM  246, com Morteiro 60, com 30 granadas;

(v) 1 Secção Morteiro 81 - 30 granadas;

(vi) Artilharia Pesada,  4 peças 11,4 com 160 Granadas (Pel Art Piche); 2 Obuses 14 com 100 (Pel Art Canquelifá); e  3 Obuses 14 com 120 granadas;

(vii) 2 PEL/REC 2 Chaimites.

,,, Mas tudo correu mal. Há dias assim em todas as guerras (**).
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(**) Último poste da série > 29 de outubro de 2019 > Guiné 61/74 - P20285: (Ex)citações (361): Do meu amigo Zé Saúde, com quem estive estes anos todos sem falar da guerra, até ao segredo dos 'Asas Brancas' de Contuboel (Manuel Oliveira Pereira, ex-fur mil, CCAÇ 3547, 1972-74)

terça-feira, 19 de novembro de 2019

Guiné 61/74 - P20364: Recordações e desabafos de um artilheiro (Domingos Robalo, fur mil art, BAC 1 /GAC 7, Bissau, 1969/71) - IX (e última) Parte: Nunca mais esquecerei aquele abraço, num lojeca em Bissau, antes do meu regresso a casa, daquele negro de Fulacunda, o Eusébio, suspeito de colaborar com o IN, e a quem poderei ter salvo a vida...



Guiné > Região de Quínara > Fulacunda >  22º Pel Art (Fulacunda, 1969/71) > "Eu e o Eusébio" [, um antigo milícia, suspeito de colaborar com o IN)

Foto (e legenda): © Domingos Robalo (2019). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]



Guiné > Região de Quínara > Fulacunda > 3.ª CART / BART 6520/72 (Fulacunda, 1972/74) >   "Porto fluvial", no Rio Fulacunda > Montagem de segurança > Um obus 14, rebocado por uma Berliet. Para i o desse e viesse...


Foto (e legenda): © Jorge Pinto (2014). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]



Recordações e desabafos de um artilheiro (Domingos Robalo, fur mil art, BAC 1/ CAC 7, 1969/71) > IX (e última) parte 

[ Foto à esquerda: 
Domingos Robalo, 
ex-fur mil art, BAC 1 / GAC 7, Bissau, 1969/71; comandante do 22º Pel Art, em Fulacunda; vive em Almada]


Está esta prosa mais longa do que eu imaginaria que fosse. Não termino sem antes referir o seguinte: em visita ao aquartelamento, o Comandante Chefe, General Spínola, é recebido com a formatura em parada. Repara que na parada estão alguns militares aprumados, mas sem a “boina negra” na cabeça, pergunta:

- Quem são aqueles que não têm boina negra?  [,os "boinas negras" era a malta da CCAV 2482]


- São o pessoal da Artilharia! [, 22º Pel Art, comandado pelo fur mil art Domingos Robalo]

Mudou o olhar, aconchegando o seu monóculo, concentrou-se nas tropas e população que o “adorava”, e é bom não esquecer estas palavras nem ter medo de as pronunciar. Falou de uma “Guiné Melhor”, a ser construída pelos Guineenses e seriam eles a decidir o seu futuro….

Estou a escrever estes factos, muito resumidamente, 50 anos depois de eles terem acontecido. Só agora dou o verdadeiro valor à memória. Coisas que aparentemente estavam escondidas ou apagadas, aparecem como se ontem tivessem sido vividas.

Mas, o deslizar a pena é como se estivesse a mexer um caldeirão onde as letras aparecem já escritas e a memória as traga à tona. Ideias que já estavam esquecidas, ultrapassadas e limpas aparecem agora em turbilhão.

Quase quatro anos de vida militar, por muito sacrifício que se tenha passado, não tem sido maior do que passar 40 anos com memórias que não tivemos oportunidade de contar ou “carpir”, como contributo de um desabafo coletivo que todos os jovens adultos do meu tempo deveriam ter feito. 


Ter-se-iam, porventura, poupado muitos dos traumas que vamos tendo conhecimento. O 25 de abril de 1974 trouxe-nos uma mudança radical de vida e de pensamento, com a esperança de uma vida em paz e de convivência com os povos que foram por nós colonizados. Com o golpe de Estado deu-se a “independência” aos povos das Colónias (então Províncias Ultramarinas), mas aprisionando-se memórias com uma barreira imposta, e auto-imposta como capa de proteção por um período da vida de quase todos os jovens adultos daquele tempo.

Conforme estou escrevendo, vou avivando essa vivência, mas também não posso nem devo calar o afronto que se fez aos militares portugueses de origem africana que, após a independência, foram assassinados por grupos que se diziam de libertadores. Libertadores de quê? 


Mais grave considero ainda que as autoridades portuguesas tenham tido conhecimento da situação e à época fez-se um silêncio total.

Através de um tripulante do navio Rita Maria ou Alfredo da Silva [, já não recordo ao certo,] fui sabendo de situações que ocorriam na Guiné. Segredo, pedia-me ele; as informações eram muito confidenciais.

Na minha Unidade, em Bissau, foram-me atribuídas várias funções:

-Participar na instrução básica e de cabos na especialidade de artilharia a militares naturais da Província da Guiné;

-Participar nas principais ações do TO, sempre que a artilharia era requisitada;

-Participar nas regulações de tiro de artilharia e elaboração das respetivas “cartas de tiro”, nos vários pelotões espalhados pelo TO;

-Participar, junto do Comando da Unidade, na então designada “sala de informações e operações”...





Infografia da emboscada de 22/2/1971,no decurso da Acção Mabecos, que envolveu forças do BCAV 2922, numa operação de escolta e segurança a forças de artilharia no trajecto Amedalai - Sagoiá - Rio Sagoiá - Rio Cimangru [... e não Camongrou] - Piche 4E545 - Rio Nhamprubana. As baixas das NT foram todas da CART 3332 (**).


Participei na Acção “Mabecos”, na terça-feira de carnaval no ano de 1971 [, em 22 de fevereiro de 1971, três meses depois da Op Mar Verde,invasão de Conacri]. 

Operação complicada, malo rganizada / planeada, com três mortos  e um soldado apanhado à mão que apenas foi libertado no pós-25 de abril de 1974 [, º 1º cabo Duarte Dias Fortunato, foto à direita]: nesta operação, debaixo de fogo na emboscada que sofremos [, no subsetor de Piche, perto da fronteira,quando íamos flagelar Foulamory, na região de Boké] eu próprio tomei a iniciativa de “ordenar”, ao pelotão [, Pel Art,]  de Sare Bacar, para desengatar um obus 14,0 cm e responder ao fogo IN, que estava a ser intenso.



Guiné > Região de Gabu > Carta de Piche (1957) > 1/50 mil > Detalhes > Percurso Piche > Amedalai > Sagoia > R Sagoia > R Cimongru > R Nhamprubana. A sudeste dwe Piche ficava a base do PAIGC, Foulamory,na região de Boké, ao alcance, a partir da fronteira, da artilharia portuguesa (peça 11.4 e obus 14).

Infografia: Blogue Luís Graça % Camaradas da Guiné (2019)



Eu estava sob as ordens do Capitão Osório, homem da artilharia, já falecido. No relatório desta operação está referido a forma elevada como o pessoal da Artilharia participou na resposta ao fogo IN.

O tempo vai correndo inexoravelmente. Estamos em abril de 1971, já com a comissão quase a chegar ao fim. Por vezes vagueei por Bissau na compra de alguns objetos para fazer embarcar num navio com destino a Lisboa.

Num desses dias, acompanhado pelo Furriel Franco, vagueávamos pelas ruelas transversais à avenida onde se situava o hospital civil [, hoje Hospital Nacional Simão Mendes]. Entrámos numa pequena loja, com uma montra muito pequena, onde estavam expostas uma camisas azuis com um monograma interessante.

Entro na loja,  secundado pelo Furriel Franco, e dirijo-me ao balcão onde estão dois “negros”.  De repente sinto-me abraçado por um deles e o peito a apertar. Não percebia o que se passava, mas a primeira impressão era o de estar a ser alvo de agressão.

Passado o sufoco e o outro negro olhando impávido e sereno para mim, recupero o fôlego e sinto que o abraço forte afinal tinha aspeto fraternal. Mas se aquilo é um abraço...

Olho para a cara do “negro” e não podia acreditar... Quem era aquele negro que assim me abraçava? Nem mais: 


- O Eusébio de Fulacunda!!!... (*)

Aquele “negro” reconhecendo-me, estava com aquele abraço a agradecer o pouco que eu, uns meses antes, lhe tinha feito naquele final do mês de setembro de 1969.

Para mim, tinha sido pouco o que lhe fizera. Mas para ele terá representado o reconhecimento de que era um ser humano como qualquer outro. Daí, aquele abraço que eu senti ter a força do Universo. Não é a cor da pele que diferencia os homens.

Onde quer que estejas, Eusébio, nunca me esquecerei de ti nem daquele abraço.

Para finalizar o meu texto. Não posso nem devo esquecer os mortos e os estropiados que as guerras sempre provocam. Elas podem ter um início, mas nunca sabemos quando terminam. Será que a nossa já terminou?

Domingos Robalo

Furriel de Artilharia, 

nº 192618/68

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Nota do editor:

(*) Último poste da série > 4 de novembro de 2019 
Guiné 61/74 - P20313: Recordações e desabafos de um artilheiro (Domingos Robalo, fur mil art, BAC 1 /GAC 7, Bissau, 1969/71) - Parte VIII: Fulacunda, usos e costumes... Lembro-me pelo menos de uma menina que foi a Bissau ao "fanado", e não voltou... Não havia, na época, preocupação de maior com a Mutilação Genital Feminina, por parte das autoridades. civis e militares


Vd. postes anteriores:

25 de outubro de 2019 > Guiné 61/74 - P20274: Recordações e desabafos de um artilheiro (Domingos Robalo, fur mil art, BAC 1 /GAC 7, Bissau, 1969/71) - Parte VII: Em Fulacunda, também havia milagres...

20 de outubro de 2019 > Guiné 61/74 - P20260: Recordações e desabafos de um artilheiro (Domingos Robalo, fur mil art, BAC 1 /GAC 7, Bissau, 1969/71) - Parte VI: Eusébio, um preso que eu mandei tratar com dignidade e que me vai ficar reconhecido

12 de outubro de 2019 > Guiné 61/74 - P20232: Recordações e desabafos de um artilheiro (Domingos Robalo, fur mil art, BAC 1 /GAC 7, Bissau, 1969/71) - Parte V: Rumo a Fulacunda, com o 22º Pel Art, passando por Bolama, e com batismo de fogo

9 de outubro de 2019 > Guiné 61/74 - P20222: Recordações e desabafos de um artilheiro (Domingos Robalo, fur mil art, BAC 1 /GAC 7, Bissau, 1969/71) - Parte IV: Depois de 4 meses a dar formação de artilharia de campanha, a graduados de pelotões de morteiro, sou colocado em Fulacunda, a comandar o 22º Pel Art

5 de outubro de 2019 > Guiné 61/74 - P20206: Recordações e desabafos de um artilheiro (Domingos Robalo, fur mil art, BAC 1 /GAC 7, Bissau, 1969/71) - Parte III: recebido em Bissau, pelos camaradas do BAC 1, de braços abertos, na noite de 12/5/1969

3 de outubro de 2019 > Guiné 61/74 - P20202: Recordações e desabafos de um artilheiro (Domingos Robalo, fur mil art, BAC 1 / GAC 7, Bissau, 1

26 de setembro de 2019 > Guiné 61/74 - P20178: Recordações e desabafos de um artilheiro (Domingos Robalo, fur mil art, BAC 1 /GAC 7, Bissau, 1969/71) - Parte I: Apurado para todo o serviço militar


(**) Vd.poste de  23 de fevereiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3926: Efemérides (17): Piche, 22 de Fevereiro de 1971 ou... Carnaval, nunca mais! (Helder Sousa)

segunda-feira, 28 de outubro de 2019

Guiné 61/74 - P20282: Controvérsias (141): o triângulo Jabicunda / Sonaco / Contuboel... Nunca foi atacado, porque tinha à volta uma série de zonas-tampão, Bafatá e a Geba, a sul e a oeste; Fajonquito, Sare Bacar, Pirada e Paunca, a norte e a leste... (Cherno Baldé)


Guiné-Bissau > Região de Bafatá > Contuboel > 16 de Dezembro de 2009 > O João Graça, médico e músico, posando ao lado do dignitário Braima Sissé. Por cima deste, a foto emodulrada de Fodé Irama Sissé, um importante letrado e membro da confraria quadriyya [, islamismo sunita, seguido pela maior parte dos mandingas da Guiné; tem o seu centro de influência em Jabicunda, a sul de Contuboel; a outra confraria tidjanya, é seguida pela maior parte dos fulas].

O Braima Sissé foi apresentado ao João Graça como sendo um estudioso corânico, filho de uma importante personalidade da região, amigo dos portugueses na época colonial [, presume-se que fosse o próprio Fodé Irama Sissé].(*)

Foto: © João Graça (2009). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]



Guiné > Região de Bafatá > Jabicunda (?) > C. 1975/76 > Em primeiro plano, sentado, mais do lado esquerdo,  está Fodé Irama Sissé. Em segundo plano, de pé, à direita, O Braima Sissé está à direita, de chapéu vermelho, ainda jovem; atrás de Fodé Irama Sissé, está Sissau Sissé (já falecido) e, "vestido à civil", Malan Sissé que foi quem em Bissau mostrou a fotografia ao nosso amigo, e membro da nossa Tabanca Grande, o antropólogo Eduardo Costa Dias, e lhe me deixou tirar "fotografia da fotografia". Entre Malan e Braima está Arafan Cont+e, aluno de Irama. Fotografia de fotografia, de autor desconhecido, datada provavelmente de 1975/76. 

Foto (e legenda): © Eduardo Costa Dias (2010). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]



Guiné > Mapa geral da província (1961) > Escala 1/500 mil > Detalhes > Zona leste > O triàngulo Jabicunda, Sonaco e Contuboel.

Infografia: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné (2019)



Cherno Baldé, Bissau
1. Comentário do nosso assessor para as questões etnolinguísticas, Cherno Baldé (Bissau), ao poste P20267 (**):

Caros amigos,

Acabo de regressar de uma viagem (missão de serviço) à zona Leste, mais precisamente ao Sector de Boé, tendo visitado as localidades de Canjadude, Tchetche (Ché-Ché), Dandum e Beli onde funcionam centros de saúde para a população.

Depois, no regresso e na região de Bafatá,  visitamos Contuboel, Cambaju e Fajonquito. Todas estas localidades estão hoje irreconhecíveis, uma sombra do que foram, sem falar das cidades de Gabu e Bafatá que estão numa situação lastimosa. Entregaram o ouro aos bandidos e não se podia esperar melhor.

Sobre o tema do presente Poste (*), só tenho a dizer aliás a reiterar o que já tinha dito em tempos: Contuboel nunca foi atacada e, na minha modesta opinião, porque não fazia parte dos planos da guerrilha e porque tanto Contuboel como Sonaco estavam rodeados de postos militares que serviam de dissuasão a qualquer ataque (Geba e os seus destacamentos, Fajonquito e seus destacamentos, Saré-Bacar, Paunca, Pirada, entre outros, a servir de tampão).



Mesmo Fajonquito, a 20 km da fronteira e situado perto da região do Oio, só foi atacada em 1964
entre os meses de Agosto e Setembro e, nessa altura, foi muito pressionado com ataques prolongados e sucessivos como nos testemunhou o Diário do soldado Incio Maria Góis´,  da CCaç 674 (1964/66), mas com a resistência da companhia e a colaboração da população e autoridades tradicionais que recrutaram milicias, a guerrilha contentou-se com emboscadas e flagelações aos postos avançados. Na verdade, já tinham conseguido assegurar o isolamento do corredor de Sitató e uma vasta zona de infiltração para o Centro do país e para o  Morés.

Uma observação que queria deixar ao Luis Graça é que, para quem vem de Bambadinca e Bafatá, o trajecto para Sonaco faz-se por estrada a partir da localidade de Djabicunda, antes de Contuboel. Embora muito próximos, a ligação entre as duas localidades fazia-se via terrestre passando por Djabicunda por causa do rio Geba.

Com um abraço amigo.

Cherno Baldé

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segunda-feira, 3 de setembro de 2018

Guiné 61/74 - P18978: In Memoriam (320): Joaquim Carlos Rocha Peixoto (Penafiel, 1949 - Porto, 2018) (Luís Graça / Alice Carneiro / Tabanca de Matosinhos / Francisco Baptista / Joaquim Mexia Alves / Ana Sequeira)



Leiria > Monte Real > Palace Hotel Monte Real >  26 de Junho de 2010 >  V Encontro Nacional da Tabanca Grande  > Uma foto para a eternidde... Uma foto, muito feliz, do Manuel Carmelita, grande fotógrafo, e grande amigo do casal: o Joaquim e a Margarida Peixoto, o nosso casalinho de professores de Penafiel, apanhados num belíssimo momento de descontracção e de ternura... (*)

Foto: © Manuel Carmelita (2010). Todos os direitos reservados.  [Edição e legendagem: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


O professor do 1º ciclo do ensino básico Joaquim Peixoto e um grupo de alunos. S/d, s/l. Foto do arquivo do Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné


O escritor (José Ferreira) e... o professor (Joaquim Peixoto). Em segundo plano, ao fundo, ao centro, o José Cancela. um velho amigo e vizinho dos Peixoto (Joaquim e Margarida). O José Ferreira escreveu sobre ele uma história deliciosa, publicada aqui no nosso blogue, e a tradicional cortejo do carneirinho, em Penafiel, tradição única no país, que remonta ao ano de 1880.


Vila Nova de Foz Coa > Restaurante do Museu do Côa > 3 de setembro de 2013 >  O meu cunhado, Augusto Pinto Soares e o Joaquim Peixoto, numa visita que fizemos juntos, com as nossas mulheres, ao Museu do Coa, com viagem de comboio até ao Pocinho.

Foto: © Luís Graça  (2013). Todos os direitos reservados.  [Edição e legendagem: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


Alguns dos seus amigos e camaradas da Guiné com quem convivia regularmente: da esquerda para a direita, José Manuel Moreira Cancela, Joaquim Peixoto,  José Manuel Lopes, Antonio Carvalho, Isolino Gomes e Manuel Carvalho. Foto de Manuel Carmelita, outro dos seus grandes amigos.

Fonte: página do Facebook do  Joaquim Carlos Rocha Peixoto.


Tabanca de Guilamilo, freguesia de Polvoreira, concelho de Guimarães... 21 de Agosto de 2011 > Sete magníficos (a contar da direita, Carvalho de Mampatá, Zé Rodrigues, Zé Manel Lopes, Zé Cancela, Joaquim Peixoto - régulo da tabanca-, Manuel Carmelita, Brito da Silva) mais um (Luís Graça, o fundador da Tabanca Grande)...

Foto (e legenda): © Luís Graça  (2011). Todos os direitos reservados.  [Edição: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


Tabanca de Guilamilo, freguesia de Polvoreira, concelho de Guimarães > 21 de Agosto de 2011 > A arte de bem receber e partilhar  do casal Peixoto > À hora refeição, em que participou também o resto da família Peixoto (o filho e a filha da Margarida e Joaquim, mais o genro, marido da Joana).

Foto (e legenda): © Luís Graça  (2011). Todos os direitos reservados.  [Edição: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


Cinfães, Porto Antigo, albufeira da Barragem do Carrapatelo > 29 de Agosto de 2011 > A Alice, o Joaquim Peixoto e a Margarida... O casal Peixoto veio à Tabanca de Candoz (Quinta de Candoz, Paredes de Viadores, Marco de Canaveses) retribuir a nossa, minha e da Alice, visita à Tabanca de Guilamilo,  no passado dia 21 de agosto de 2011.

Foto (e legenda): © Luis Graça (2011). Todos os direitos reservados. [Edição: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


Vizela > 30 de agosto de 2010 > Santuário de São Bento, a 410 metros acima do nível do mar, ao pôr do sol... Dois camaradas da Guiné, Joaquim Peixoto e Luís Graça, os dois primeiros inscritos na Tabanca de Guilamilo....

Foto (e legenda): © Luis Graça (2011). Todos os direitos reservados. [Edição: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


Joaquin Carlos Rocha Peixoto (Penafiel, 1949- Porto, 2018), Foto da página no Facebook.


Obrigado, Joaquim, pelo privilégio de te termos  conhecido... E até um dia, lá no Olimpo dos deuses, dos heróis, e dos amigos e camaradas da Guiné!... 



1. Conheci o Joaquim e a Margarida Peixoto por ocasião do IV Encontro Nacional da  Tabanca Grande, na Quinta do Paul, Ortigosa, Monte Real, Leiria, em 20 de junho de 2009. Por um feliz acaso, apresentei-os à Alice  por que serem da mesma região; eles, de Penafiel, a Alice, do Marco de Canaveses... Ficámos, para sempre, bons amigos, os dois casais.

A Alice proporcionou logo a seguir, na sua casa, nesse verão o reencontro da senhora professora Margarida Peixoto com alguns dos seus antigos meninos e meninas...  A escola primária de Passinhos /Foz, no Marco de Canaveses, em 1972, foi o seu primeiro ano de atividade como professora. (**)

Eu e o Joaquim estivemos naturalmente presentes... Encantados. Foi um momento único, irrepetível. Como têm sido, para muitos de nós, alguns momentos aqui proporcionados pelo nosso blogue... De tal modo que já paga direitos de autor a frase O Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande.

Em 11 de julho desse ano,  já se havia apresentado formalmente à Tabanca Grande  o Joaquim Carlos Rocha Peixoto, ex-fur mil inf,  com o curso de Minas e Armadilhas, da CCAÇ 3414 (Bafatá e Sare Bacar, 1971/73 (***).
CCAÇ 3414: Joaqiim Peixoto e Fernando Ribeiro (c. 1973)

Mas os nossos contactos remontavam já a 2007, quando o Joaquim respondeu a um pedido de
informação  nosso sobre o seu camarada Fernando Ribeiro, natural de Condeixa, morto em 1973 numa emboscada na estrada de Binta-Farim (****)

O nosso malogrado camarada Joaquim Peixoto (1949-2018) nasceu em Canelas, Penafiel. O pai era um conceituado comerciante. Também tinha um irmão que já morreu.

Segundo os dados que constam na sua página no Facebook, andou no Colégio João de Deus, no Porto,  e frequentou o Liceu Nacional de Guimarães. Já depois depois de regressar da Guiné, e por conselho da sua namorada e futura esposa, fez o curso de professor  no Magistério Primário de Penafiel (*****).

Era casado, pai de um filho e uma filha, avô de dois netos (de 3 e 5 anos) que o adoravam. Foi professor do 1º ciclo do ensino básico, tendo-se reformado no Agrupamento Escolar de Penafiel Sul. Leccionou durante anos na Casa do Gaiato, em Paços de Sousa. Aí o professor também foi aluno, recebeu lições grandes de vida, por que naquela instituição acolhem-se e educam-se meninos da rua, alguns dos quais com dramáticas histórias de abandono, violência, exclusão social...

Sempre o conheci como  um homem simples, bom, discreto, sensível, reservado (mas nem por isso menos alegre e brincalhão), hospitaleiro, amigo do seu amigo, enquanto a Margarida, também nossa grã-tabanqueira (***),  é uma típica nortenha, de verbo fácil e a sensibilidade à flor da pele. Tive o privilégio de estar com eles, na sua belíssima casa nessa belíssma terra, que é Penafiel, da qual então era então um sítio de passagem, a camimnho de Candoz, desde 1975... O pouco que sabia, do tempo da guerra colonial,  é que Penafiel era a capital do vinho verde. Ora é muito mais do que isso: rica de história, património e gente boa. Uma terra que ele amava e de que tinha orgulho  (******).

Também passei, duas vezes, pela Quinta de Guilamilo, muito ligado à memória do seu pai, que ele estava a recuperar, e onde gostava de receber os amigos, e em especial dos camaradas da Guiné.


2. Depoimentos sobre o Joaquim Peixoto

(i) Luís Graça & Maria Alice Carneiro (*******):

Estivemos, ontem à noite, na Igreja das Freiras, em Penafiel, a despedirmo-nos do nosso amigo Joaquim, e a acompanhar na dor a Margarida, a sua filha e o seu filho... Apesar de tudo, era uma família que mostrava uma grande serenidade e dignidade... O Joaquim esperara por eles para morrer, em paz, ao fim da manhã!... Lucidamente, apenas com a morfina para lhe aliviar as dores físicas!...

Desgraçadamente era uma "morte anunciada"... Morre-se sozinho, sendo este o ato mais solitário da vida, mas a companhia dos que nos amam é um bálsamo!... Não há melhor morfina do que o amor e a compaixão!... Que lição extraordinária, esta, para todos nós que receamos esse momento derradeiro e fatal... Como iremos morrer? Às três da manhã, sozinhos, numa cama do hospital, o "terminal da morte", ou lúcida, digna, corajosamente, de mão dada com os que nos amam?... 

Que melhor despedida podia querer um homem bom e um grande camarada da Guné como o Joaquim?!

Soubemos pela Margarida, quanto bem lhe fez, em vida, o nosso blogue e as amizades que ele criou e alimentou na Tabanca Grande, na Tabanca de Matosinhos, na Tabanca dos Melros e na Tabanca de Guilhomil, em Guimarães, de que ele era o generoso e hospitaleiro régulo.

Obrigado/a, Joaquim, pelo privilégio de te termos conhecido... E até um dia, lá no Olimpo dos deuses, dos heróis, e dos amigos e camaradas da Guiné!... 

Malta da Tabanca de Matosinhos, vamos fazer-lhe a nossa homenagem de despedida no almoço de 4.ª feira? Eu e a Alice alinhamos, ainda estamos por cá esta semana!... E ver-nos-emos, mais logo, com certeza, às 15 horas, na derradeira despedida do Joaquim desta "terra da alegria".

À Margarida e à sua família apresentámos também os votos de pesar da Tabanca Grande e demais tabancas, incluindo a de Candoz.


(ii) Tabanca Matosinhos

Um Camarada que parte para a eternidade.

Joaquim Carlos Rocha Peixoto

Um camarada que parte deixa-nos sempre um pouco de si. O Peixoto deixou-nos muito de si:
- Deixou-nos a amizade profunda que sabia cultivar, enriquecida pela alegria, o seu sorriso, a sua meiga palavra de acolhimento...


A sua forte vontade de viver e saborear o que a vida tem de bom era contagiante.
O Peixoto partiu. Deixou-nos mais pobres. Paz à tua alma, bom amigo. Bem mereces.

À sua esposa Margarida e demais família as nossas profundas condolências e a nossa amizade.



(iii) Francisco Batista (*******):

Aos homens bons, aos melhores homens de todos nós, desejamos uma vida longa para podermos usufruir, se possível até ao limite, a sua companhia tão agradável e relaxante.

A perda do amigo Joaquim Peixoto, que ainda há poucos meses era um homem saudável, bom, alegre, transparente, vai criar em mim um vazio que ninguém poderá preencher. Tenho a certeza que o mesmo acontecerá a muitos camaradas e amigos que o conheceram e que conviveram com ele.
A minha mulher que o conheceu, a ele e à esposa Margarida, num almoço na quinta do poeta da Régua [, José Manuel Lopes e Luisa Valente], e gostou muito do casal, gostaria muito ir ao funeral amanhã. Eu, por maioria de razões, mais conhecimento e mais convivência gostaria muito de estar presente, mas porque a minha mulher está bastante adoentada, embora por doença passageira segundo me dizem, terei que lhe fazer companhia e não vamos poder ir. 

À Margarida enviamos um grande abraço de pêsames, sabemos que a sua dor é grande, nós compartilhamos dela e tal como nós uma multidão de homens e mulheres que o conheceram que o estimaram e se sentiram felizes e honrados com a sua convivência.


(iv) Joaqim Mexia Alves (********)

(...) Pergunto-me se o conhecia assim tão bem e chego à conclusão de que não, mas a sua bonomia, a sua simpatia, o seu olhar sereno, confiante, camarigo, ligado ao da sua mulher, Margarida, transporta-me para uma realidade que queria longe de mim e que é o saber que nós, os camarigos, vamos partindo, e que não sei se deixamos história, se deixamos sentimentos, se deixamos alma lusa, para motivar os vindouros, que já cá vão estando!

O Joaquim Peixoto era a serenidade em pessoa, pelos menos para mim, e na sua partida, chora-me o coração de camarigo, mas anima-se a minha alma de cristão: Ao homem bom, Deus recebe sempre no seu amor!

Sirvo-me da expressão popular e desejo que a “terra lhe seja leve”, porque aos homens bons Deus toma-os nos seus braços e leva-os para a eternidade!

A ti, meu amigo, camarigo, Joaquim, como eu, junto-me em oração à tua Margarida, à tua família, e espero que lá no “assento etéreo a que subiste”, nos relembres sempre junto daqu’Ele que é a vida, para que também nós a ti nos juntemos um dia, fazendo de um bocadinho do Céu, uma porção de Guiné! (...)


(ii) Ana Sequeira

 Joaquim Carlos Rocha Peixoto, obrigada pela tua amizade! Jamais me esquecerei do teu sorriso e boa disposição! Obrigada pelo teu companheirismo e apoio tão paternal quando cheguei à cidade de Penafiel!! Sou muito grata por te ter conhecido, por termos feito parte de uma equipa fantástica na Escola Básica de Guilhufe, de ter privado contigo e os teus momentos que guardarei eternamente na minha memória e no meu coração! Descansa em paz! Voltaremos a estar juntos, um dia! Beijinho desta tua "filha"...
________________


(**) Vd, blogue A Nossa Quinta de Candoz >  10 de setembro de  2009 > A homenagem da professora aos seus primeiros alunos (Escola de Passinhos, 1972)




(******) Vd. poste de 18 de outubro de 2009 > Guiné 63/74 - P5126: Um Casal Garcia, para desinfectar o dente... (Joaquim Peixoto, ex-Fur Mil, CCAÇ 3414, Bafatá e Sare Bacar, 1971/73)

quinta-feira, 7 de abril de 2016

Guiné 63/74 - P15948: Notas de leitura (825): "A Descolonização da Guiné-Bissau e o Movimento dos Capitães", de Jorge Sales Golias (a lançar na 5ª feira, dia 14, em Lisboa): pré-publicação de um excerto por cortesia do autor: A perda da supremacia aérea – Março de 1973


Guiné > Pós 25 de abril > Primeiro encontro entre as NT e o PAIGC > O Cap Silva Ramalho, companhia de Saré Bacar [, na fronteira com o Senegal, a 39 km a nordeste de Contubole], sentado à direita, de óculos escuros, a falar com um representante do PAIGC, através de um intérprete.

Foto (e legenda): © Jorge Sales Golias (2016). Todos os direitos reservados



Capa do livro de Jorge Sales Golias, "A descolonização da Guiné-Bissau e o movimento dos capitães" (Lisboa, Edições Colibri, 2016), a ser lançado no próximo dia 14 deste mês, 5ª feira, às 18h, na CPHM - Comissão Portuguesa de História Militar, Palácio da Independência, Largo de São Domingos, 11, Lisboa. (*)


1.  Mensagem de Jorge Sales Golias, do dia 5 do corrente:

Boa noite, camarada Luís,

Agradeço-lhe as suas palavras e, bem assim, toda a explicação detalhada sobre a perfomance do blogue.

Não lhe vou prometer grande colaboração porque estou envolvido numa teia de compromissos que me esgotam os tempos livres. Mas quem corre por gosto não cansa.

E para prestar a minha homenagem a este site extraordinário que o camarada  coordena.  vou então mandar-lhe para pré-publicação um extracto do texto do  livro "A Descolonização da Guiné-Bissau e o Movimento dos Capitães". 

Mando  também uma foto não publicada sobre o 1º Encontro NT-PAIGC.

Abraço do Jorge Golias,

Jorge Sales Golias,  transmontano de Mirandela, nascido em 1941, ex-cap eng trms, licenciado em engenharia electrónica pelo IST - Instituto Superior Técnico, membro do MFA, Bissau, adjunto do CEME, gen Carlos Fabião em 1974/75, cor trms ref, administrador de empresas].



2. Excerto do livro "A Descolonização da Guiné-Bissau e o Movimento dos Capitães" (Lisboa, Edições Colibri, 2016).  Cortesia do autor (**)


(...) A perda da supremacia aérea – Março de 73

As comunicações mais críticas no TO eram, sem dúvida, as de pedido de apoio aéreo (APAR). A rede de APAR de VHF funcionava nas frequências exclusivas de 49,0 e 51,0 MHz. Em combate, as ligações faziam-se entre os E/R AVP-1 e os E/R ARC-44 do aéreo (59).

Esta ligação era dificultada pela não total compatibilidade dos rádios do Exército e da Força Aérea, mas sempre se fazia satisfatoriamente, o que era vital, pois em situações de combate, nomeadamente de emboscadas, o apoio aéreo era prestado em poucos minutos, dadas as curtas distâncias em jogo.

Tal status garantia às NT que as situações de confronto eram relativamente curtas, pois os guerrilheiros do PAIGC sabiam que rapidamente ficavam sob fogo aéreo dos aviões T-6 e Fiat G-91 e retiravam, dispersando antecipadamente.

Outro apoio vital era o das evacuações por helicóptero (Allouette) directamente do mato para o Hospital Militar de Bissau (HMB). Os pedidos de apoio aéreo feitos para a Base Aérea Militar eram em HF, com os AN/GRC-9 (60) e os RACAL TR-28.

No entanto, o status da supremacia aérea, determinante para as NT desde o início da guerra em 1963, viria a perder-se em 1973, dez anos depois, com a introdução no campo de batalha, pelo IN, dos mísseis terra-ar SAM-7 (STRELA), de fabrico soviético. Estes eram portáteis a dorso e actuavam orientados por raios infravermelhos e visando a fonte quente do aéreo.

Registo a este respeito os primeiros abates no TO de FIAT G-91, em Março de 1973, um com o tenente Miguel Pessoa em Guileje (61)  que se ejectou e foi recuperado pelas NT (através de uma operação especial no dia seguinte) e outro, dias depois, pilotado pelo tenente-coronel Almeida Brito, no Sul, que foi a primeira vítima desta nova arma.

Dos vários aviões alvejados, cito o do capitão piloto aviador Pinto Ferreira, do meu curso da AM [, Academia Militar], que viu sair o míssil e através de uma acrobacia o conseguiu despistar.

O comandante da Zona Aérea era o coronel piloto aviador Lemos Ferreira, que nesta altura, em face da recusa de alguns pilotos em voar, ele próprio desempenhou algumas missões. (...)

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Notas do autor:


(59) Também havia pedidos de APAR pelas redes de HF, High Frequency, Alta Frequência, de 3 a 30 Mhz, que permitia uma comunicação a maiores distâncias, mas cuja ligação na Guiné nem sempre era possível.

(60) Army Navy/Ground Radio Communications, de origem Americana.

(61) O PAIGC usou aqui pela 1ª vez o Strela. Para tal atacou de dia a guarnição para a obrigar a pedir apoio de fogos. Apoio pedido, foi o avião atacado logo que chegou e deu-se o 1º abate no território.




de que o Jorge Sales Golias é coborador


3. Nota do editor:

Agradecemos a gentileza do camarada Jorge Sales Golias, que não conhecemos pessoalmente, e a quem saudamos pelo lançamento do seu livro. Oportunamente, será feita a  devida "nota de leitura" ou recensão bibliográfica a cargo do nosso colaborador permanente Mário Beja Santos ou por iniciativa de qualquer outro dos leitores do livro que o queiram comentar publicamente, aqui no nosso blogue.

Apraz-nos registar que os camaradas da Guiné, independentemente da época em que lá estiveram, da sua condição militar (arma, especialidade, posto, etc.) têm vindo a escrever e a publicar livros sobre os acontecimentos em que participaram, nesta antiga província (ou colónia) portuguesa, entre 1961 e 1974. 

Nunca é demais recordar  que o nosso blogue não tem nenhum bandeira, a não ser a da camadaragem e da verdade. Somos um blogue de memórias e de afectos. E é importante que todos os camaradas da Guiné  se sintam aqui tão confortáveis, neste espaço plural, a Tabanca Grande,  onde todos cabemos com tudo aquilo que nos une e até com aquilo que nos pode separar.  

Jorge, parabéns, boa sessão de lançamento e boa sorte para o livro. LG

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Notas do editor:

(*) Vd. postes de 


3 de abril de 2016 > Guiné 63/74 - P15932: Agenda cultural (472): sessão de lançamento do livro de Jorge Sales Golias, "A descolonização da Guiné-Bissau e o movimento dos capitães" (Lisboa, Edições Colibri, 2016, 385 pp.), dia 14 de abril de 2016, 5ª feira, às 18h, na Comissão Portuguesa de História Militar, Palácio da Independência, largo de São Domingos, 11, Lisboa. Prefácio: cor Carlos Matos Gomes; apresentação: cor Aniceto Afonso